Toda vez é assim: pede, ela fica. Diz, ele entende. Toda vez é essa corrente. Que não larga nem desata, parece até prece bem feita, linha que prende na carne como quem desdenha da costura alheia. Dois em tudo, zero infinito, matemática que desobedece a regra lógica, músculo de veias grossas, pés de meias que se perdem, cores diferentes nos pés dos pares imperfeitos. O mundo deles é estreito. E estica feito corda em brincadeira. Derradeira. Como amantes moribundos, que riem alto, sabem tudo. Mas ninguém entende. Dente no dente. É assim que andam juntos, quase um, quase dez, desavergonhados. Escancaram os afetos perdoados. Dançam no meio da rua como se perdessem a compostura, duas pobres criaturas a andar sem paradeiro. Bola do mundo a girar sem eixo. Em desleixo.
Andam aos segredos. Curtos nomes que se agregam, sobrenomes que se deixam. Mãos em braile às avessas. Ela abandonou as facas. Ele ganhou três beijos. Ainda são crianças, curtas calças, finos dedos. Saia que levanta sob as nuvens ensolaradas. Não se importam com as risadas, os cochichos, os bocejos. Brincam de espadas que não machucam em nada, é bobeira, é realejo. Fitas que prendem os cabelos. Que já não se penteiam. Abandonaram os espelhos. Sem muletas nem defeitos. Confiam na retina alheia. E caminham como se tudo fosse uma grande brincadeira. De gente grande. E dispara no grande fôlego dos amores que já nascem tortos, que almeja grandes vôos, meio ânsia, meio vômito. Uma ânsia que parece verdade. Que eles chamam de felicidade. E a cidade adormece. Nos pastéis das tintas cores. Na mão do desenhista a achar caminhos paralelos. Mas que insiste na linha que desemboca no infinito. É um risco. Enquanto segura forte a mão dela. Que canta. A melodia que lembra uma cantiga sobre dores e brinquedos. Sobre olhos que se viram inteiros. Só de olhar para ele. Hoje chove sobre alguns canteiros.